16 de setembro de 2010

acordar

Hoje acordei novamente no hospital e vou adormecer em casa. Faz precisamente um ano que tive alta do mesmo hospital. Depois de primeira cirurgia, do coma e da passagem pelos vários serviços da neurologia sinti hoje uma enorme alegria por sair daquele edifício, por repetir a sensação de caminhar na rua. Quando cheguei a casa encontrei uma mensagem linda colada na porta do meu quarto (o mimo estendeu-se ao pai que fica sempre nervoso quando voltamos a Santa Maria... são imensamente generosas as crianças).

Hoje não encontrei o o "peso" que senti no olhar dos meus filhos há um ano atrás. É radicalmente diferente a ansiedade com que me esperavam e isso fez-me sentir sossegada, o medo está a afastar-se deles. Para mim não foi fácil voltar o serviço onde já tinha sido operada. E, apesar da calma tive de segurar muito bem a mão de Jesus enquanto me preparavam. Confesso que quando as máquinas se aproximavam da minha cabeça pensei que não ia conseguir. Pedi uns momentos e até perceber que não estava só e foi isso que me deu forças para aguentar o momento em que os médicos pararam, intencionalmente, a irrigação a uma parte do cérebro para concluirem o exame. Senti o interior da minha cabeça como se estivesse a ser sugado por uma seringa... como se a massa estivesse a ser retirada. Mais uma vez senti algo que será muito próximo da morte, quando o sangue deixa de chegar ao cérebro... mas senti também a maravilhosa sensação de tudo voltar ao normal no interior da minha cabeça. Escrevo tudo isto porque este internamento trouxe-me algo mais. Além das caras conhecidas que encontrei, das experiências que partilhei e da excelente notícia que recebi: os três aneurimas que tinham sido tratados desapareceram completamente, esta estadia impôs-me muitos momentos de reflexão.

Dou graças porque este exame não podia ter um resultado melhor. Não voltarei a ter que colocar mais stents neste lado! Também agora sinto que aceitei muitas coisas que achava ter aceitado e não era bem assim. Aceitei que terei de voltar a fazer estes exames muitas vezes. Aceitei que faço parte das caras conhecidas do serviço e que devo dar graças a Deus por continuar a ir lá, ainda que me custe tanto ficar internada. A verdade é que isso quer apenas dizer que estou viva! Penso que até hoje estava convencida que já estaria despachada, os exames já não seriam tão exigentes... mas esta noite dei por mim a pensar em tudo o que me aconteceu desde há um ano. Para além do que cresci interiormente desde que acordei do coma, o que mais me emociona é sentir o previlégio que tenho por estar viva, muito mais viva que alguma vez tinha estado.

Não foi fácil este ano, não foi nada fácil "arrumar" a descoberta dos seis aneurismas em vez dos quatro que pensava ter. Não foi fácil despedir-me da minha mãe em Janeiro e no mês passado ver partir o meu pai. No entanto, os encontros com amigos que não via há anos, a celebração de um dos melhores dias da minha vida e o facto de estar a ser tratada fez deste ano um ano em grande! A partir de agora recomeçam as rotinas, as idas e vindas à escola, ao conservatório, ao meu voluntariado, aos escuteiros... e ainda o regresso a faculdade e a uma licemciatura que sempre ficou por fazer e me dará imenso prazer. Fica o meu agradeceimento a todos os que me acompanham, que pensam e rezam por mim sem me conhecerem, que se preocupam. Obrigada a todos. Fica esta oração, feita com palavras coloridas pelas aguarelas, que continua colada na porta do meu quarto e que diz: Bem Vinda Mãe. Obrigada por estarem ai.

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