19 de dezembro de 2012

enquanto espero

enquanto espero... Espero... Regresso às Palavras Soltas enquanto espero... espero o serralheiro que mudará as portas da casa da minha mãe, do eu mimo, do meu abrigo. Ainda que ela já ter partido há anos... em direcção ao sol, a verdade é que só hoje consigo confrontar-me com o trocar destas portas... Em mim, respira esta necessidade de proteger a presença da minha mãe, a intimidade das nossas cumplicidades... voltar, uma vez mais, a sentar-me nestes degraus, só eu e ela... ao seu colo... Espero... Enquanto espero que o serralheiro me atenda volto aos primeiros natais que conheci, ao menino jesus, à missa do galo, ao casaco pesado que me atiravam para cima sem noção nenhuma do peso que estavam a colocar-me, ao oito anos, nos meus ombros. Não me lembro que algum dia me tenha aquecido, lembro-me sim o quanto era pesado... e do tempo que o meu corpo franzino passava enviada nele e nós enfiados na grande e fria Sé, feita de granito. Espero... Enquanto espero o homem, sem o ouvir, concentro-me nas expressões faciais que variam entre o stress dos compromissos, as solicitações da mulher e o desejo repetido de "Boas Felizes" a clientes, amigos... E perco-me outra vez para não me sentir intrusa. Enquanto isso balaço os calcanhares nestas pedras geladas e gastas. Conventro-me nos movimentos, ondulantes, entre o ar que sai da minha boca e as temperaturas que o tornam visível, ainda que por segundos... e penso, penso num caminho que começou aqui... Espero... Depois de combinar um novo encontro para amanhã, com a leve sensação que outros telefonemas, desta vez a desejar um Feliz Natal, possam interferir nos detalhes do encontro que marcamos para amanhã... e despeço-me do serralheiro com o compromisso que irá colocará novas portas, mais resistentes, mais dignas na casa da minha mãe.... Afasto-me a sorrir para dentro, ao som dos diferentes tons de um sotaque que me cativa, e que aqui torna os votos desta quadra familiares e diferentes, consoante os interlocutores que imagino continuarão a ligar-lhe... Espero... E volto a um outro tempo de espera... à espera de uma amiga que vem de longe... uma amiga que partilhou comigo os degraus onde hoje me sentei... uma amiga que me relembra das histórias que vivemos juntas, das filhós que a minha mãe fazia para o Natal... que partilhou comigo muitos dos dias que fazem parte das saudades da minha mãe...

1 comentário:

  1. E depois de tanto tempo voltar a ler alguma coisa aqui é um dos maiores e melhores presentes de Natal... Obrigada por isto, Isabel!

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